janeiro 16, 2006

Procriação assistida: religião e política 2

Publico aqui um comentário que deixei no blog da deputada socialista Teresa Venda associado a um post sobre procriação medicamente assistida (PMA):

Cara deputada

Deverão ser beneficiários das técnicas de PMA os casais heterossexuais, com relação estável. Esta exigência visa acautelar os interesses e a dignidade do nascituro e o bem-estar da criança que venha a nascer em consequência da aplicação das técnicas utilizadas por razoes médicas.
Não deveriam acautelar os interesses de todas as crianças e não apenas das que nascem a partir da PMA? Ou há umas cautelas com a PMA que seriam impraticáveis em geral? Isso não deveria fazer reflectir sobre a legitimidade da lei decidir que pessoas podem usar a PMA? A coerência de critérios deveria levar à proibição de gerar filhos a pessoas que não constituíssem um casal heterossexual com relação estável. Quem o fizesse seria naturalmente punido.
Também neste debate foi claro que a questão nuclear se situa na identificação do momento do princípio da vida, e a partir daí do respeito que é devido ao novo individuo, à nova pessoa.
Não é só na PMA que existem embriões que morrem. Que medidas para proteger os embriões que resultam de relações sexuais normais? Se uma mulher fértil está a tomar um medicamento que impede a nidação e tem relações sexuais pode estar a produzir uma "pessoa" (se assim considera o embrião antes da nidação) condenada a morrer imediatamente. Não deveria a lei assegurar que estas situações não ocorrem punindo quem prevaricar?

Sabe-se também que na natureza muitos embriões se perdem por não nidarem naturalmente. Se no futuro a PMA conseguir uma taxa de nidação muito elevada, não deverá nessa altura a lei vir a proibir a procriação natural por ser uma forma bárbara que provoca a morte de muitos embriões e impor a obrigatoriedade da PMA para todos os casais? Nessa altura procriar naturalmente será uma forma de criar desnecessariamente embriões condenados à morte. E a medicina existe para evitar mortes de pessoas quando isso é possível. Votei PS e sou católico mas francamente acho que o projecto de lei anda demasiado colado à hierarquia católica. Isto é muito estranho pois o PS mostra uma desmedida preocupação com os embriões na PMA e permite a venda livre da pílula do dia seguinte. Será que no PS não há um pensamento coerente sobre estas questões? Ou será que nos dois casos se aposta sobretudo no não nascimento de crianças? (Na PMA dificulta-se o sucesso e veda-se o acesso em nome da defesa dos embriões, na pílula do dia impede-se a nidação liquidando os mesmos embriões.)