Para que haja Natal
Por vezes para que haja Natal, para que uma criança nasça, é necessária a ajuda da medicina. Em Espanha vai ser debatida no Congresso uma nova lei com o objectivo de "facilitar al máximo la posibilidad de tener hijos de todas las mujeres que se someten a procesos de fecundación in vitro" (via Renas e Veados).
Em Portugal, infelizmente, prepara-se uma lei que cria obstáculos reais ao sucesso da fecundação in vitro e restringe ainda as situações em que as pessoas podem recorrer a tais técnicas. O que me choca mais é que há muita gente bem pensante que se dedica a criar obstáculos à reprodução assistida, mas que clamaria aos céus e à terra se fossem criados obstáculos semelhantes à reprodução natural. Tudo resumido, vejo muito preconceito e uma ética muito moldável a esse preconceito.
23 Comments:
A inquisição ataca novamente na bioetica. Uns trabalham, criam novas possibilidades e depois aparecem uns vampiros que nada sabem fazer mas que acham que podem decidir o que é correcto.
Caro Amigo
Faço votos para que tenha um Bom Natal e um Feliz Ano Novo, assim como a sua família e amigos.
J. Mariano
O que é tecnicamente possível, nem sempre é humanamente desejável (veja-se a energia atómica e Hiroshima). Actualmente podemos manipular quase tudo: a vida, a morte, as emoções... Manipular seres humanos para benefício de terceiros, sempre se fez, mas as consequências sociais destas atitudes têm sido dolorosas. A questão é sempre saber o que é que nos dignifica mais: fazer, ou não fazer.
A discussão sobre o fim da II Guerra continua; a discussão sobre o Iraque, mal começou; e tivemos Paris, a arder.
"A questão é sempre saber o que é que nos dignifica mais: fazer, ou não fazer."
Para mim o que está errado é tentar a priori arrumar a questão na dicotomia fazer ou não fazer. A energia atómica é tão útil que se continua a usar. A bomba atómica como arma de guerra é terrível mas se um asteróide vier em direcção à Terra pode salvar a humanidade.
A vida humana é manipulada desde há muito. O homem sempre teve o poder de iniciar a vida de um novo ser, de ajudar a viver, de permitir a morte e de matar deliberadamente. Hoje manipulamos mais do que antes mas a manipulação em si não é boa nem má. Manipula-se o sangue, tira-se de uns e dá-se a outros. Manipulam-se órgãos e muitas pessoas já têm peças artificiais dentro de si. As emoções sempre se manipularam. O que penso que não nos dignifica é, como dizia o ON, que haja pessoas que pouco têm a ver com os processos em causa, convencidas que são donas da dignidade humana, convencidas que os outros são bárbaros desumanos, que tentam definir regras absolutas, mas apenas nas situações que elas escolhem.
A distinção entre procriação assistida e procriação não assistida é extraordinariamente ténue. E se se definisse para a procriação natural as mesmas leis que se pensa impor para a procriação assistida?
J. Mariano
Um Feliz Natal e um óprimo ano de 2006 para si e para os seus.
Não responde à questão.
Quem tem voz e poder, decide, quem não tem voz ou poder, aguenta?
Caro anónimo
No caso da procriação assistida, o Estado pretende definir quem pode e não pode usá-la. O argumento é de que está a proteger os direitos da criança que vai ser gerada. O que digo é que se isto fosse argumento o Estado deveria exigir uma licença aos pais para gerarem um filho biológico. Quando uns pais sem qualquer capacidade para ter um filho biológico iniciassem uma gravidez sem licença deveriam ser punidos com uma pena de prisão. Aí o Estado estaria a defender "quem não tem voz ou poder" evitando situações como aquelas a que temos assistido relativas à morte de crianças por negligência ou maus tratos. Concorda com a imposição da necessidade de uma licença parental para iniciar uma gravidez?
Julguei que a licença era para manipular um ser humano, e em que circunstâncias. Pareceu-me que era essa a questão. Algo assim como decidir - e quando, e quem - como se pode forçar a alimentação artificial de um doente em coma, sem que isso signifique que os restantes cidadãos precisem de autorização para almoçar...
"forçar a alimentação artificial de um doente em coma"
Não percebo a palavra "forçar" neste contexto. No caso da Terri Schiavo, por exemplo, a questão era quando é que se podia parar a alimentação, mesmo que essa alimentação precisasse de um tubo! Admitindo algum paralelo na dicotomia natural/artificial, precisamente porque ninguém precisa de licença para almoçar, nenhum médico precisa de licença para alimentar alguém com um tubo desde que isso seja adequado.
Mas precisaria de licença para matar um ser humano, mesmo que isso fosse "apenas" porque muitas das técnicas de procreação assitida presumem (tranquilamente) que a morte de dois, três ou mais seres é justificável para "produzir" um embrião. Os liberais chamariam a isto uma questão de "produtividade", os colectivistas acham que é apenas o preço para se fazer engenharia social.
No fundo impomos as nossas conveniências de adultos aos nossos irmãos humanos em fase embrionária, como já se fez (e faz) aos doentes terminais e agora, na Holanda, se vai começar a fazer também aos não terminais e aos menores.
"Mas precisaria de licença para matar um ser humano"
Na procriação assistida não se mata por matar. Tal como na natureza, sabe-se que nem todos os que iniciam a vida chegarão a todas as etapas. Na procriação natural também se perdem muitos embriões. Deverá o Estado proibir a procriação (artificial e natural) para que nenhum embrião morra sem nidar? Nos países pobres, onde os pais sabem que se têm muitos filhos nem todos chegarão à idade adulta, deverão os pobres ser proibidos de ter mais do que um certo número de filhos?
Tem sido este o argumento usado para justificar quase todas as guerras, incluindo as guerras "preventivas"...
Actualmente há multinacionais farmaceuticas que o esgrimem para justificar os ensaios de medicamentos em crianças do terceiro mundo: já que provavelmente vão morrer cedo, então que sejam para (nosso) benefício.
É uma questão que nos leva ao núcleo da civilização humana: todos os sers humanos são pessoas, ou não?
" Tem sido este o argumento usado para justificar quase todas as guerras, incluindo as guerras "preventivas"..."
O que defendo não é que se mate mas que se deixe nascer, mesmo sabendo que pode vir a morrer! Não percebo como mistura isto com a defesa da guerra.
"Actualmente há multinacionais farmaceuticas que o esgrimem para justificar os ensaios de medicamentos em crianças do terceiro mundo: já que provavelmente vão morrer cedo, então que sejam para (nosso) benefício."
Continua a confusão de argumentos. Eu não estava a defender a utilização terapêutica de embriões mas sim a dizer que não se justifica criar obstáculos à procriação medicamente assistida. Segundo a perspectiva de limitação de nascimentos que parece defender, essas crianças que as multinacionais querem usar nunca deveriam sequer ter nascido e deveria haver uma lei que tivesse impedido os pais de as ter.
"É uma questão que nos leva ao núcleo da civilização humana: todos os sers humanos são pessoas, ou não?"
Embora não seja a questão que eu estava a debater, esta questão não nos leva ao núcleo da civilização mas sim aos detalhes da filosofia. Na pratica parece-me que ninguém valoriza um embrião ao mesmo nível da pessoa. A pena por aborto nunca teve nada a ver com a pena por homicídio. Dar personalidade jurídica aos embriões levar-nos-ia a tantas confusões e problemas que muito poucos o defendem (e esses duvido que tenham uma ideia clara de qual seria o resultado de tal medida). Se quisermos considerar o ponto de vista cristão, quantas mulheres católicas poderão dizer que amam um embrião a ponto de oferecerem o seu útero para o receber?
Pessoalmente penso que a dicotomia não pessoa/pessoa não é aplicável na prática quando estamos perante o processo de desenvolvimento do ser humano. Valorizando mais ou menos o embrião e o feto, parece haver sempre um processo progressivo ao longo do desenvolvimento em que a protecção e os direitos do ser em desenvolvimento são cada vez maiores.
CA,
não percas o teu tempo!
Os imbecis não são convencidos, morrem.
As instituições povoadas de imbecis, definham.
As sociedades que não se precavêem contra os imbecis, ficam para trás.
Quem perde demasiado tempo com eles, perde a oportunidade de fazer coisas mais interessantes.
Discute com alguém que valha a pena, como eu. Sinto-me insultado por preferires discutir com esse imbecil.
És capaz de me explicar essa preferencia?
Vais continuar na fronteira da igreja, virado de costas para o mundo? olha para trás de vez em quando!
ON
Podes chamar-me a mim o que quiseres mas não acho boa ideia que chames imbecil a outro leitor deste blog.
És capaz de me explicar essa preferencia?
"És capaz de me explicar essa preferencia?"
Bem, para começar o anónimo apresentou argumentos que eu posso rebater, enquanto tu o chamaste de "imbecil". Gostaria que as conversas não derivassem deste modo, pelo menos neste blog. Este tipo de derivas não é alheio à relutância que tenho em entrar em certos debates. Em segundo lugar nem sempre quero discutir um determinado assunto num determinado momento ou de um determinado modo. Penso que esse deve ser um direito de qualquer pessoa.
1) A procriação medicamente assistda, tal como geralmente se entende (não é toda assim), é feita à custa da "selecção" de seres humanos - uns a quem se dá, literalmente, o direito a continuarem vivos, outros que se matam, ou que se congelam, que é uma versão soft do matar, uma vez que não haverá condições para os manter vivos. Por cada um que é implantado, muitos serão mortos, não por acidente ou imprevisto, mas como mera estratégia de rentabilização da tecnologia disponível. Seria possível fazer diferente, mas é mais caro e mais trabalhoso.
2) As tentivas de estabelecer nuances na dignidade devida aos seres humanos, desde a concepção à morte, são tão antigas como a humanidade, e os resultados sociais não são apetecíveis (desde a escravatura às guerras, o que se faz é dizer que uns são mais (ou menos) pessoas (ou outro conceito que se queira) que os outros.
3) Não percebo o que é que a religião tem a ver com o assunto. Nunca precisei de invocar a religião para discutir estas questões que remetem para a biologia (quando começa o ser humano), a lei (quem são os seres humanos que se devem proteger) e a ética (o que nos acontece como sociedade quando admitimos excepções ao princípio do não matar). Se a dignidade humana for uma questão religiosa, então não poderíamos perseguir nenhum ditador que se declarasse ateu ou agnóstico.
4) Fico-me por aqui, visto que não sou grande coisa a manejar adjectivos, prefiro razões e argumentos.
Um bom ano a todos.
Caro anónimo
Um bom ano também para si.
Reafirma as suas posições mas não responde propriamente a diversas questões. Aproveito para comentar os seus argumentos:
"uns a quem se dá, literalmente, o direito a continuarem vivos, outros que se matam, ou que se congelam, que é uma versão soft do matar, uma vez que não haverá condições para os manter vivos"
Alguns embriões são introduzido no útero e por isso o que se lhes dá é uma probabilidade (baixa, como na procriação natural) de sobreviverem. Os que são congelados correm maior risco mas ficam congelados para virem a ter essa possibilidade de transferência para o útero. A selecção que é feita baseia-se apenas nas possibilidades de sobrevivência (não têm os médicos que fazer "selecções" semelhantes em diversas situações em que o equipamento é escasso?)
"Por cada um que é implantado, muitos serão mortos, não por acidente ou imprevisto, mas como mera estratégia de rentabilização da tecnologia disponível. Seria possível fazer diferente, mas é mais caro e mais trabalhoso."
Não é só mais caro e trabalhoso. Envolve sérios riscos de saúde para a mulher e reduz as probabilidades de nascer uma criança. Quanto à "rentabilização da tecnologia disponível", não é isso que faz toda e qualquer gestão de um serviço de saúde? Ou haverá um hospital completamente equipado em cada aldeia para que ninguém morra numa ambulância a caminho do hospital mais próximo? A própria natureza, no que diz respeito à reprodução, usa a estratégia de produzir muitos e por cada criança que nasce, mesmo no processo natural, há muitos embriões perdidos! Quando o homem repete o processo natural ficamos escandalizados?
"As tentivas de estabelecer nuances na dignidade devida aos seres humanos, desde a concepção à morte, são tão antigas como a humanidade, e os resultados sociais não são apetecíveis (desde a escravatura às guerras, o que se faz é dizer que uns são mais (ou menos) pessoas (ou outro conceito que se queira) que os outros."
Perceberia melhor o que quer dizer se me tivesse dito o que pensa do facto de o aborto ser proibido mas não ser considerado um homicídio e tratado penalmente como tal. Em segundo lugar falar da dignidade do ser humano da concepção à morte implica já uma escolha filosófica (típica da hierarquia católica e de alguns meios católicos) de considerar que antes da implantação do embrião no útero tem já um ser humano que merece toda a dignidade de pessoa humana. O que faltaria seria tirar dessa posição todas as consequências que dela derivam. Poderia, por exemplo, levá-lo a proibir a reprodução natural dentro de algumas décadas.
"Fico-me por aqui, visto que não sou grande coisa a manejar adjectivos, prefiro razões e argumentos."
Lamento que o ON tenha escrito o que escreveu. Mas penso que sempre usei argumentos e coloquei questões relativas ao assunto em debate. Gostaria apenas que os princípios gerais que invoca fossem realmente gerais (aplicáveis a qualquer situação) e clarificados quanto às suas consequências em qualquer situação. O que tenho visto por vezes é que há princípios que são usados exclusivamente na questão da procriação assistida.
CA, estive a ler com atenção este diálogo. Concordo com a forma como vês esta questão. Dou-te um exemplo pessoal:
Um dia uma pessoa da minha família teve um acidente, ficando em estado de coma. Levado para o hospital e ligado a meios exteriores para se manter vivo, os médicos avisaram a família que como o estado dele era muito grave, se aparecesse alguém com mais hipóteses de sobrevivência dariam os meios que estavam a utilizar para o manter vivo, a outra pessoa. Lembro-me bem da angústia que isso nos provocou. (Acredito que para os médicos também não seria fácil, tomar essa opção, mas se fosse necessário, teriam que o fazer).Esteve em coma durante quase quatro meses e depois recuperou, muito limitado, mas continua vivo. É uma pessoa a quem amamos e temos de cuidar com especial cuidado.
Isto tudo para dizer que muitas vezes não queremos ter nas nossas mãos a Vida e o seu cuidado, mas o que é facto, é que temos.
Nesta discussão da criação assistida creio que os argumentos filosóficos, religiosos, se sobrepõem ao que é facto. E o facto, é que a Vida está nas nossas mãos, quer queiramos quer não.
Enquanto a Igreja (Magistério)continuar a ver a Criação como algo que aconteceu no passado e não obra continuada pelos homens, veremos sempre argumentos destes.
CA, estive a ler com atenção este diálogo. Concordo com a forma como vês esta questão. Dou-te um exemplo pessoal:
Um dia uma pessoa da minha família teve um acidente, ficando em estado de coma. Levado para o hospital e ligado a meios exteriores para se manter vivo, os médicos avisaram a família que como o estado dele era muito grave, se aparecesse alguém com mais hipóteses de sobrevivência dariam os meios que estavam a utilizar para o manter vivo, a outra pessoa. Lembro-me bem da angústia que isso nos provocou. (Acredito que para os médicos também não seria fácil, tomar essa opção, mas se fosse necessário, teriam que o fazer).Esteve em coma durante quase quatro meses e depois recuperou, muito limitado, mas continua vivo. É uma pessoa a quem amamos e temos de cuidar com especial cuidado.
Isto tudo para dizer que muitas vezes não queremos ter nas nossas mãos a Vida e o seu cuidado, mas o que é facto, é que temos.
Nesta discussão da criação assistida creio que os argumentos filosóficos, religiosos, se sobrepõem ao que é facto. E o facto, é que a Vida está nas nossas mãos, quer queiramos quer não.
Enquanto a Igreja (Magistério)continuar a ver a Criação como algo que aconteceu no passado e não obra continuada pelos homens, veremos sempre argumentos destes.
MC
Obrigado pelo comentário. Vou tentar responder ao que me pedes no comentário ao outro post.
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